Audiência Pública reforça defesa da Deso e do Banese como empresas públicas
Na tarde da terça-feira, 1º de outubro, a Câmara Municipal de Aracaju realizou Audiência Pública, proposta pelo vereador Américo de Deus (Rede), para tratar do tema “Fortalecimento e Defesa das Entidades Púbicas Deso e Banese”, como resposta aos movimentos que o governo estadual está fazendo para vender parte das ações do banco estatal no mercado de valores e a contratação de consultorias para estudos de viabilidade econômica da Companhia de Saneamento de Sergipe.
Contribuíram com debate o presidente e o secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores em Água e Esgoto de Sergipe – SINDISAN, Sílvio Sá e Sérgio Passos; a presidente do Sindicato dos Bancários de Sergipe – SEEB-SE, Ivânia Pereira; o economista Luís Moura, do Dieese; o deputado estadual Iran Barbosa (PT); além dos vereadores Lucas Aribé (PSB), Isac Silveira (PCdoB) e Camilo Lula (PT), e participantes como o ex-vereador Antônio Góis, o Goisinho, bem como representantes de movimentos sociais e sindicais interessados no tema.
O secretário-geral do SINDISAN, Sérgio Passos, chamou a atenção para a necessidade de ampliar o debate com a sociedade sobre a importância da Deso e das companhias de saneamento públicas como instrumentos de desenvolvimento e de garantia de saúde para a população. Ele também chamou a atenção para a campanha sistemática que vem tomando os meios de comunicação, há algum tempo, com vistas a desgastar a Deso e outras empresas estatais, com manchetes sempre negativas.
“Existe um interesse muito grande de empresas multinacionais em entrar pesado no setor de águas e de saneamento, como a Nestlé, Coca-Cola, BRK Ambiental, entre outras. Estão todas de olho nos nossos mananciais. É preciso entender que água é um bem vital e insubstituível. Água não é mercadoria e não pode ser tratada como commodities. Água é vida”, destacou Passos.
O sindicalista apontou números que mostram a importância da Deso para os sergipanos: a Companhia abastece totalmente 71 municípios sergipanos, e outros três, parcialmente. Lembrou que das 71 cidades totalmente abastecidas pela Deso, 61 são deficitárias economicamente.
“Se privatizarem a Deso, como ficarão as populações dessas 61 cidades que não dão lucro? Qual a empresa privada que vai querer operar onde não terá lucro? Por isso vamos voltar a dialogar com os vereadores e os prefeitos dessas cidades, colocando os riscos de uma possível privatização da Deso”, disse, destacando a cidade de Palmas, no Tocantins, onde a concessão do saneamento foi concedida à empresa privada Odebrecht Ambiental (agora comprada pela canadense BRK Ambiental), que devolveu a concessão de 78 cidades que não davam retorno financeiro para a empresa, ficando apenas com 47 cidades que davam lucro.
“É esse o debate que queremos fazer com a sociedade e defender a Deso como uma empresa pública viável. O que falta à Deso são investimentos e gestão. Por isso estamos pedindo o apoio dos vereadores e deputados, como Américo de Deus e Iran Barbosa, que têm compromisso com o povo. Esperamos contar com o apoio de todos e da sociedade para que a gente não perca esse grande patrimônio que é a Deso”, conclamou o sindicalista.
Sérgio Passos também apontou que é preciso que os vereadores de Aracaju comprometidos com os aracajuanos procurarem Edvaldo Nogueira (PCdoB) para dialogar e convencer o prefeito a formalizar o contrato de concessão dos serviços de saneamento com a Deso, responsável por 97% da água canalizada da capital e por 60% do esgotamento sanitário. Aracaju responde por 60% do faturamento da Companhia. “Estamos solicitando uma audiência com ele há três meses e ainda não obtivemos resposta”, lamentou.
Trabalhadores comprometidos
O presidente do SINDISAN, Sílvio Sá, complementou a fala do secretário-geral destacando o importante papel desempenhado pelos trabalhadores comprometidos da Deso num sistema que precisa funcionar 24 horas por dia, muitas vezes sem que a empresa dê as necessárias condições de trabalho e, em outras situações, enfrentando lama, calor, insalubridade e riscos.
Ele lembrou que, apesar de Sergipe possuir cinco bacias hidrográficas, a totalidade de suas águas é salobra, restando os 320 quilômetros de Rio São Francisco que banham o estado para abastecer mais da metade da população sergipana, com a outra metade sendo abastecida por mananciais subterrâneos que nem sempre fornecem água de qualidade, precisando de muito tratamento por parte da Deso.
“Água é um bem finito, limitado e a população cresce a cada dia, o que impõe sempre grandes desafios à Deso, que não produz água. Ela capta, trata e distribui, mas a imprensa insiste em desgastar a Companhia”, disse, elencando as quatro situações em que mais se critica a empresa: falta de água, valor da tarifa, vazamentos e, em menor intensidade, a qualidade da água. Sílvio defendeu a estatal das críticas, muitas das quais equivocadas, e destacou, ainda, que 70% da arrecadação da Deso é oriunda das camadas de baixa renda, com a taxa mínima de 38 reais para o consumo de até 10 mil litros de água.
“Como comparativo, é bom lembrar que o valor equivale ao que se paga por cinco ou seis galões de água mineral (20 litros cada galão). Paga-se por cerca de 100 litros de água mineral quase o mesmo que se paga por 10 mil litros de água tratada pelo Deso chegando em sua casa. E ainda temos a tarifa social, que é a metade, 19 reais”, relatou.
O sindicalista refutou os discursos que tentam plantar na população a lógica de que só o que é privado funciona, destacando os casos negativos das privatizações do saneamento em Palmas (TO), Manaus (AM) e Uruguaiana (SP), onde as tarifas triplicaram, os serviços não foram ampliados e estão muito longe de serem universalizados.
“Importante lembramos que, caso a Deso venha a ser privatizada, os três impostos (ICMS, PIS e Cofins) que hoje não incidem na tarifa por se tratar de empresa pública, passarão a ser cobrados, aumentando a tarifa de água para os sergipanos em 32%”, alertou.
Não é solução
A presidente do Sindicato dos Bancários de Sergipe, Ivânia Pereira, reforçou que privatização nunca foi a solução para os problemas das empresas, dos trabalhadores, nem da população, lembrando dos casos das privatizações da Telergipe (Oi/Telemar) e Energipe (Energisa), que redundaram em uma massa de demissões, aumento das terceirizações, queda na massa salarial, precarização, aumento das tarifas e piora em muitos serviços prestados.
“As empresas estatais no Brasil sempre foram sinônimo de solução. Foram as nossas estatais que trouxeram desenvolvimento econômico e social para o país. Basta um esforço mínimo para lembrar disso. E quem mais sofre com as privatizações sãos sempre a classe trabalhadora e o povo mais humilde. Portanto, privatizações não nos interessa”, disse, reforçando que há toda uma campanha negativa orquestrada, sendo massivamente veiculada na grande mídia para desgastar as estatais a fim de desvalorizá-las e facilitar as privatizações, induzindo a população a apoiar tal iniciativa.
Para Ivânia, não é possível defender o Banese sem defender a Deso. “A Deso sempre foi a garantia para a população sergipana de saúde pública. É só procurar saber como era a qualidade da nossa água antes do tratamento institucional dado pela Deso. Ninguém mais fala em verminoses nas nossas crianças. É preciso relacionar a extinção de várias doenças por causa da Deso”, relatou, lembrando que o Banese também sempre cumpriu com o papel de indutor da economia sergipana, assim como outros bancos estatais que dão orgulho aos brasileiros, como o Banco do Nordeste, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica, todos na mira das privatizações de Bolsonaro e de Paulo Guedes.
“Não nos interessa vender ações do Banese ao setor privado, porque isso certamente vai enfraquecer o banco. Precisamos unir forças e lutar contra esses que querem destruir o patrimônio do povo sergipano e do povo brasileiro para favorecer os grandes capitalistas nacionais e internacionais, que não têm compromisso nenhum com o bem-estar da população e com a nossa soberania. Vamos resistir sempre na defesa do Banese e da Deso como os maiores patrimônios do povo de Sergipe”, afirmou Ivânia Pereira.
Concessão de Aracaju
O economista Luís Moura reforçou a necessidade de os vereadores da Capital buscarem pressionar a Administração Municipal para que busque formalizar com a Deso o contrato de concessão dos serviços de água e esgotamento, assim como buscar o retorno das contas da Prefeitura para o Banese, repassadas à Caixa na gestão passada de João Alves Filho.
“Os vereadores precisam mostrar ao prefeito Edvaldo Nogueira a importância dessa concessão ser efetivada com a Deso, bem como as contas da Prefeitura voltarem para o Banese. Essa operação é importante porque muitos servidores municipais deixaram o banco; felizmente, uma parte permaneceu com o banco estadual. Mas esses movimentos mostrariam que o prefeito é a favor do Banese”, disse e coordenador do Dieese em Sergipe, criticando a proposta do governo estadual de vender as ações do banco estatal. “É uma ideia equivocada. Pode acontecer o que aconteceu com o Banrisul, que fez toda uma festa para vender suas ações e depois se viu que a operação não foi boa para a instituição porque o mercado pagou um preço muito abaixo do que se esperava”, lembrou.
O vereador Américo de Deus, proponente da Audiência Pública, defendeu o debate sobre a importância da Deso e do Banese para os sergipanos, destacando que o governo federal vem implementando uma política de Estado mínimo, com reflexos também em Sergipe.
“Estamos na contramão de países como a China e os Estados Unidos, por exemplo, que têm juntas mais de mil estatais. Se entregarmos o nosso patrimônio para o capital estrangeiro, será uma tragédia. O que precisamos é de gestão, pessoas capacitadas e comprometidas à frente das nossas estatais, que não dão prejuízo; muito pelo contrário. E se dão lucro, por que de desfazer delas?”, questionou.
“Aqui, o nosso problema é um governo que vem de muito tempo numa gestão desastrosa e deixou o Estado desequilibrado financeiramente. E para resolver essa falta de recursos, encomenda-se estudos para uma possível privatização da Deso, e fala-se em venda de ações do Banese, que, como se diz, será uma privatização como mingau, comendo pelas beiradas até não sobrar mais nada. O momento da nossa economia é delicado, mas não é vendendo o patrimônio do povo que se resolverá os problemas”, entende o vereador, que encaminhou duas propostas ao fim da audiência: a busca de assinaturas de outros vereadores para a criação de uma Frente Parlamentar em Defesa da Deso e do Banese, e uma campanha aberta de conscientização da população na defesa dos dois maiores patrimônios públicos do Estado.