Privatização do saneamento defendida por Temer é questionada até pela ONU
A Medida Provisória (MP) assinada por Michel Temer no último dia 6/7, modificando o marco regulatório do setor de saneamento e abrindo o mercado para as empresas privadas é vista com ressalvas pela Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo o relator especial das Nações Unidas sobre o tema, o brasileiro Léo Heller já afirmou diversas vezes, “as empresas privadas não investem o suficiente e adota política de exclusão de populações mais pobres, impondo tarifas mais altas.
Além disso, não atingem as metas dos contratos”. Segundo ele, o próprio Banco Mundial, antes defensor das privatizações no saneamento, já reconheceu que as privatizações não são uma “panaceia para todos os problemas”.
Nas duas últimas décadas, aproxidamente 200 cidades, em todos os continentes, remunicipalizaram os serviços de água e esgotos que não funcionou sob comando privado.
As quebras ou não renovações dos contratos ocorreram por falhas das empresas em atingir metas de universalização, além de problemas com transparência e dificuldade de monitoramento do serviço pelo setor público.
As informações se baseiam em estudo de 2014 que mostrou tendência global de reestastização dos serviços. Segundo o relatório, nos últimos 15 anos houve ao menos 180 casos de remunicipalização do fornecimento de água e esgoto em 35 países, em cidades como Paris (França), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina), Budapeste (Hungria), La Paz (Bolívia) e Maputo (Moçambique). Desse total, houve 136 casos em países de alta renda e 44 casos em países de baixa e média renda.
No mesmo período, houve um menor número de privatizações, solução adotada por Nagpur (Índia), onde a iniciativa passou por forte oposição e crítica, e Jeddah (Arábia Saudita).
O estudo, elaborado pela Unidade Internacional de Pesquisa de Serviços Públicos (PSIRU), Instituto Transnacional (TNI) e Observatório Multinacional, apontou ainda que as iniciativas de reestatização ocorreram como resposta às falsas promessas dos operadores privados e sua incapacidade de priorizar o atendimento às comunidades em detrimento do lucro, além de falta de transparência e dificuldade de monitoramento de suas atividades pelo poder público.
“Experiência direta com problemas comuns da administração privada da água — da falta de investimentos em infraestrutura, a aumentos tarifários a riscos ao meio ambiente — convenceu comunidades e autoridades de que o setor público está mais bem posicionado para fornecer serviços de qualidade a cidadãos e promover o direito humano à água”, disse o relatório das organizações.
Heller lembrou que recentemente, no Brasil, o discurso da privatização do saneamento básico voltou à tona. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou em junho que pretende ajudar o governo do estado do Rio de Janeiro a privatizar empresas, como a Companhia Estadual de Águas e Esgotos (CEDAE).
“O que podemos observar é um discurso forte no sentido de privatização do sistema, como grande saída para resolver o problema”, disse. “Mas não é essa a lição de experiências de privatização em outras partes do mundo. Por trás desse discurso poderíamos ler uma tentativa de afastamento do Estado em sua obrigação de oferecer saneamento”, declarou.
Para Pedro Blois, presidente da FNU – Federação Nacional dos Urbanitários, “mais uma vez comprova-se a tese de que o governo Temer pretende mesmo transformar o Brasil numa terra arrasada, no que diz respeito também às políticas públicas, no pouco tempo que lhe resta à frente do Palácio do Planalto. Vamos lutar para derrubar essa MP no Congresso.”
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