Ação popular pede suspensão do processo licitatório de concessão de água e esgoto em Sergipe
Foi protocolada na quarta-feira, 28, no Tribunal Regional Federal de Sergipe, ação popular contra o Governo do Estado e o BNDES por atos potencialmente lesivos ao patrimônio público que podem ser causados pela concorrência pública Internacional 01/2024, que tem como objeto a concessão da prestação regionalizada dos serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário da Microrregião de Água e Esgoto de Sergipe – MAES.
A ação é de autoria dos engenheiros Adauto Santos do Espírito Santo e Marcos Helano Montenegro, ambos associados ao Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS), que vem apontando diversas inconsistências no projeto. Os autores, que têm larga atuação e experiência na área de saneamento básico, pedem a impugnação do edital e a suspensão da licitação que ele inicia, “por força das graves falhas técnicas derivadas do péssimo planejamento e da inaptidão técnica dos estudos de viabilidade que motivam o procedimento, tornando-o, portanto, juridicamente viciado e nulo”.
A Ação é direcionada ao Governo do Estado e ao BNDES, responsável pela estruturação dos estudos de modelagem da concessão. O texto protocolado no Tribunal de Justiça Federal de Sergipe detalha uma sequência de gravíssimos erros materiais nos documentos apresentados para deflagrar a licitação, indicando “pressupostos fáticos e técnicos que levarão a concessão ao desequilíbrio e ao aumento abusivo da tarifa ao usuário final”.
Irregularidades e incoerências
A ação popular se baseia na análise técnica feita pelos autores em toda a documentação que embasa o processo de concorrência, que encontrou omissões e erros graves principalmente em três documentos: o Plano Microrregional de Saneamento Básico (PMSB), o Plano de Negócios Referencial (PNR) e o Estudo de Viabilidade Técnica e Econômico-Financeira (EVTE), todos essenciais para a modelagem da concessão e para o planejamento e execução dos serviços de saneamento.
A ação critica a adoção de projeções populacionais do Censo de 2010, ignorando os resultados do Censo de 2022. Com isso, há uma superestimação de 331.915 habitantes (15% superior), uma vez que o Censo mais recente registra 2.209.558 habitantes no Estado de Sergipe, contra os 2.541.473 habitantes projetados para 2020 pelo Censo anterior.
Outra falha do PMSB é a não inclusão de 61 localidades atualmente atendidas. “A inevitável inclusão posterior dessas localidades acarretará inevitavelmente pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro por parte da concessionária, o que poderá gerar impactos negativos ao Contrato”, diz o texto.
O mesmo documento também superestima o consumo de água, projetando um consumo per capita de 154,7 L/hab./dia, muito acima dos 108,36 L/hab./dia registrados em 2022 pelo Serviço Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), que é alimentado por dados das próprias companhias de saneamento. Segundo a ação Popular, essa superestimativa levará a um acréscimo de 30% a 40% no consumo de água per capita em Sergipe. “A consequência das superestimativas do crescimento populacional e dos consumos de água e de geração de esgotos é a projeção de faturamentos da futura concessionária que muito provavelmente não ocorrerão, o que poderá dar causa a pedidos de elevação das tarifas”, define o texto da Ação Popular.
Outra falha grave no PMSB revelada pela Ação Popular é a não inclusão em sua base de cálculo dos custos de aquisição de água tratada, ao contrário do Plano de Negócios Referencial (PNR), que prevê uma despesa total de R$ 13,1 bilhões com aquisição de água tratada ao longo de 35 anos, a ser fornecida pela DESO. “Essa omissão compromete a precisão do planejamento financeiro, resultando em uma subestimação potencial dos custos operacionais reais”, diz o texto da Ação Popular
Um outro agravante no documento é a não quantificação dos investimentos e dos custos operacionais para assegurar que a DESO garanta com confiabilidade a água potável que vai ser distribuída aos usuários finais pela concessionária. “O risco é que a Companhia estadual sofra drástica redução de receitas, e torne inviável seu funcionamento”.